II
MENSAGEM DA RESSURREIÇÃO
Pietro Ubaldi (Páscoa de 1932)
De
além do tempo e do espaço chega minha voz. É uma voz universal que fala
ao mundo inteiro e verdadeira permanece através dos tempos. A verdade
não pode sofrer mudanças se olhada por esta ou aquela nação, se
observada por uma raça ou outra, porque a alma humana é sempre a mesma
em toda parte, se examinada em sua profundeza.
Venho
a vós, na Páscoa, acima de tudo para iluminar e confortar, pois vos
achais imersos numa vaga de dores. Crise a denominais e a imaginais
crise econômica. Eu, porém, vos digo que se trata de uma crise
universal, crise de todos os vossos valores morais, de todas as vossas
grandezas. É o desmoronar-se de todo um mundo milenário. Digo-vos que a
crise se encontra sobretudo em vossas almas: crise de fé, de orientação,
de esperanças. É o vertiginoso momento de grandes mutações.
Trago-vos
esperança, orientação, paz. A cada um falo hoje a palavra da verdade e
do amor, palavra que não mais conheceis. Quero reconduzir-vos às origens
milenárias da fé com o intelecto novo, nascido de vossa ciência. No dia
da Ressurreição, repito-vos a palavra da ressurreição, a fim de que
possais compreender a dor e ultrapasseis as estreitas fronteiras de
vossa vida. Comovido, falo a cada um no sagrado silêncio de sua
consciência.
Ó
tu que lês, afasta-te, por um momento, dos inúteis ruídos do mundo e
escuta! Minha voz não te atingirá através dos sentidos, mas, através
desta leitura, senti-la-ás aflorar dentro de ti na linguagem de tua
personalidade. Minha voz não chega, como todas as coisas, do exterior,
contudo, surgirá em ti, por caminhos desconhecidos, como coisa tua, da
divina profundeza que em ti existe e na qual também estou.
O
universo é infinito e de longe venho, atraído pela tua dor. Nada me
atrai tanto como a dor, porque somente nela o homem é grande, e se
purifica e redime, dirigindo-se para destinos mais elevados. É triste
serdes assim golpeados, mas, somente sofrendo, podeis compreender a
realidade da vida. Exulta, porque este é o esforço da tua ressurreição!
A quem sofre eu digo: “Coragem! És um decaído que na sombra reconquista a grandeza perdida”.
É
a justa reação da Lei que livremente transgredistes e que exige o
retorno ao equilíbrio; instrumento de ascensão, a dor vos aponta o
caminho de que fugistes; impõe-vos reabrirdes vossa alma, fechada pelas
alegrias fáceis que infelizmente vos cegam, para que alcanceis júbilos
mais altos e verdadeiros. A dor é uma força que vos constrange a
refletir e a buscar em vós mesmos a verdade esquecida. É imposição de um
novo progresso.
Abraça
com alegria esse grande trabalho que te chama a realizações mais
amplas. Se não fosse a dor, quem te forçaria a evolver para formas de
vida e de felicidade mais completas?
Não
te rebeles; pelo contrário, ama a dor. Ela não é uma vingança de Deus e
sim o esforço que vos é imposto para mais uma conquista vossa.
Não
a amaldiçoes, mas apressa-te a pagar o débito contraído pelo abuso da
liberdade que Deus te deu para que fosses consciente. Abençoa essa força
salutar que, superando as barreiras humanas, sem distinção transpõe
todas as portas, penetra o que é secreto, e fere, e comanda, e dispõe, e
por todos se faz compreender. Abraça a dor, ama-a, e ela perderá sua
força. Aceita a indispensável escola das ascensões. Se te revoltares,
tua força nada conseguirá contra um inimigo invisível e a violência, em
retorno, mais impetuosamente cairá sobre ti.
Coragem!
Ama, perdoa e ressuscita! Não procures nos outros a origem de tua dor,
mas, sim, em ti mesmo, e arrepende-te. Lembra-te de que a dor não é
eterna, porém uma prova que dura até que se esgote a causa que a gerou.
Tua dor é avaliada e não irá jamais além de tuas forças. O mundo foi
criado para a alegria e a alegria lhe voltará. Da outra margem da vida,
outras forças velam por ti e te estendem os braços, mais do que tu
ansiosas pela tua felicidade.
Falei com o coração ao homem de coração. Falarei agora à inteligência.
Tendes,
ó homens, a liberdade de vossas ações, nunca a de suas conseqüências.
Sois senhores de semear alegria ou dor em vosso caminho, e não o sois de
alterar a ordem da vida. Podeis abusar, porém, se abusardes, a dor
reprimirá o abuso. De cada um de vossos males, fostes vós mesmos que
semeastes as causas.
O
maior erro de vossos tempos é a ignorância da realidade moral, íntima
orientação da personalidade, que é o fundamento da vida social.
O
homem moderno se aproxima de seu semelhante para tomar-lhe alguma
coisa, nunca para beneficiá-lo. A vossa civilização, que é econômica,
está baseado no princípio “do ut des” , que é a psicologia do egoísmo. É
a força econômica sempre a reger o mundo. A psicologia coletiva não é
senão a soma orgânica dessas psicologias individuais. A riqueza se
acumula onde a força a atrai, e não onde a necessidade ou superiores
exigências a reclamam; não constitui instrumento de uma vida de justiça e
de bem, mas, sim, máquina de poder, representando, em si mesma, um
objetivo. A lei de equilíbrio é constantemente violada e impões reações.
Não dominais a riqueza, conduzindo-a a fins mais elevados: é a riqueza
que vos domina.
Trabalhai,
mas que o escopo do vosso trabalho não se reduza apenas a proveitos
isolados e egoístas, e sim a frutificar no organismo social; somente
então se formará aquela psicologia coletiva, que é a única base estável
da sociedade humana.
Fazei
o bem, todavia, lembrai-vos de que o pobre não deseja propriamente o
supérfluo de vossas riquezas, mas que desçais até ele, que partilheis de
sua dor e, até, que a tomeis para vós, em seu lugar.
Venerai
o pobre: ele será o rico de amanhã. Apiedai-vos do rico que amanhã será
o pobre. Todas as posições tendem a inverter-se a fim de que o
equilíbrio permaneça constante. A riqueza tende para a pobreza e a
pobreza para a riqueza. Ai daqueles que gozam! Bem-aventurados os que
sofrem! Esta é a Lei.
Não
confieis no mundo, que rirá convosco enquanto tiverdes força e
bem-estar; confiai, antes, em mim, que venho quando sofreis e vos trago
auxílio e conforto. Já vedes, hoje, que a dor realmente existe e que nem
o ceticismo nem qualquer poder humano conseguem afastá-la.
Uma
radical mudança verificar-se-á na sociedade humana, a fim de que a vida
não seja um ato de conquista, onde triunfe o mais forte ou o mais
astuto, mas, sim, um ato de bondade e de sabedoria em que seja vitorioso
o mais justo. Investigando-as com vossa ciência, achareis no íntimo das
coisas essa suprema Lei de equilíbrio que vos governa; aprendereis que a
bravura da vida não está em violar essa Lei, semeando para vós mesmos
reações de dor, porém, em segui-la, semeando efeitos de bem. Deveis
também aprender que o vencedor não é o mais forte – esse é um violador –
e sim quem segue conscientemente o curso das leis e sem violência se
equilibra no seio das forças da vida. As religiões já o revelaram,
entretanto, não acreditastes; a ciência o demonstrará, todavia não
desejareis ver. O momento é decisivo. Ai de vós se, nesta vitória de
civilização material em que viveis, desejardes ainda perseverar no nível
do bruto.
Está
maduro o mundo, mas, ao mesmo tempo, cansado de tentativas e
experiências, do irresolúvel emaranhado de vossos expedientes; cansado
de viver no momento, em face de um amanhã repleto de incógnitas; e quer
seriamente prever e resolver os grandes problemas da vida, quer
francamente olhar o futuro, ainda que isso reclame uma grande coragem.
O
mundo tem necessidade da palavra simples e forte da verdade e não de
novas astúcias a rolarem por velhos caminhos. O mundo espera essa
palavra com ansiedade, como também a aguarda o momento histórico.
A
psicologia coletiva tem o pressentimento, embora confuso, de uma grande
mudança de direção; sente que o pensamento humano, não mais infantil,
apresta-se para tomar as rédeas da vida planetária e que o homem vai
substituir o equilíbrio instintivo e cego das leis biológicas por outro
equilíbrio, consciente e desejado. Por isso está buscando a luz, para
que seu poder não naufrague no caos.
Não
está longe de desaparecer vossa psicologia experimental, que será
substituída pela psicologia intuitiva; esta a muito longe conduzirá
vossa ciência. Novos homens divulgarão a verdade; não mais serão
mártires cobertos de sangue, nem se assemelharão aos anacoretas de
outrora, porém homens de inteligência e de fé, que difundirão seus
pensamentos utilizando-se de moderníssimos recursos, homens que servirão
de exemplo no meio do turbilhão de vossa vida.
Despedaçai
a férrea jaula que o passado para vós construiu, e onde já não vos
resta espaço. Ousai abandonar os velhos caminhos mas não ouseis
loucamente, onde não há razão para ousadias; ousai na direção do alto e
nunca ousareis demasiadamente. Do grande mar de forças latentes, que não
percebeis, imensa vaga levantará o mundo.
Até
lá, guardai a fé! A vossa crise, se é profunda e dolorosa, fará, no
entanto, nascer o homem novo do terceiro milênio. Para resolvê-la,
recordai que ela é mal de substância, que não se debela corrigindo a
forma, como procurais fazer. Para solucioná-la é necessário considereis o
problema em sua substância; e sua substância é o homem, sua psicologia,
sua alma, onde se encontra a motivação de suas ações, a fonte original
dos acontecimentos humanos. Eis aí a chave do futuro.
Vosso
multimilenário ciclo de civilização está a esgotar-se; deveis retomá-lo
em nível mais elevado, vivê-lo mais profundamente, não somente crendo,
mas, também, “vendo”.
Ai
de vós se, depois de haverdes atingido o domínio do planeta, não
dominardes a máquina, a riqueza e as vossas paixões, com um espírito
puro.
Sois
livres e podeis também retroceder. No período que resta deste século se
decidirá do terceiro milênio. Ou vencer, ou morrer: e a morte, desta
vez, é a morte pior, porque é morte de espírito. A todos eu digo :
“Ressuscitai com a minha ressurreição”.
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